segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A Revolução na Farmácia

Muitas revoluções passam despercebidas porque as alterações que causam acontecem aos poucos. Este é o caso da revolução por que passa o tratamento médico-farmacêutico nos últimos anos. Longe vai o tempo em que xaropes e lombrigueiros eram os medicamentos do dia-a-dia. Na minha infância, tomar lombrigueiro era um evento especial. Por um lado porque o forte laxante obrigava as crianças a permanecerem em casa. Por outro, para compensar o gosto amargo do remédio, meus irmãos e eu éramos presenteados com guaraná – grande luxo na época.

Hoje podemos aproveitar remédios com sabores agradáveis, e o que é melhor, muito mais eficientes. Para desenvolver os chamados remédios de última geração, milhões de reais são gastos anualmente pela indústria farmacêutica. São 3 os principais objetivos na criação de novos remédios: aumentar a eficácia para combater uma determinada doença, diminuir os efeitos colaterais, e facilitar a administração do medicamento.

Um leitor curioso pode se perguntar: com tanta evolução nos medicamentos, por que não conseguimos nos livrar das dolorosas injeções? Afinal, por que nem todo remédio pode ser administrado com comprimidos ou em líquido? Acontece que o composto ativo, responsável pela capacidade terapêutica do remédio, pode ser constituído de moléculas pequenas – como o analgésico paracetamol. Entretanto, há casos em que o composto ativo é um hormônio, como a insulina, ou mesmo um vírus inativo empregado em vacinas, que podem ser até 1000 vezes maior do que o paracetamol. Não é surpreendente, portanto, que esses compostos muito grandes tenham dificuldade em ultrapassar as barreiras naturais em nosso corpo, para atingir o alvo. Há outras limitações no modo de administrar um remédio. A insulina usada por diabéticos só pode ser administrada via intravenosa. Se o fosse por via oral, a insulina seria destruída em contato com o suco gástrico do estômago.

Controlar como o fármaco é transportado no corpo humano é, assim, crucial para a sua eficácia. Normalmente o composto ativo é misturado a um chamado agente carreador, responsável por “carregar” o composto ativo ao seu destino. Espero grandes avanços nos próximos anos. Daqui a uma década, talvez achemos inacreditáveis as limitações atuais da distribuição do composto ativo no corpo humano. Só para exemplificar, se hoje um paciente tem uma infecção em determinado órgão, muitas vezes toma medicamento que se espalhará por toda a corrente sanguínea, por não ser possível controlar sua chegada ao alvo. Por isso, a dose ingerida tem que ser maior do que a necessária só para o órgão afetado, o que aumenta as chances de efeitos colaterais.

Uma relação que talvez poucos suspeitassem emerge. Desenvolver novos fármacos tem tudo a ver com nanotecnologia. Como já escrevi neste espaço, a nanotecnologia consiste em produzir e controlar materiais na escala nanométrica – de um milionésimo de um milímetro. E o tamanho das barreiras e dos compostos ativos é exatamente de alguns a dezenas de nanômetros. Com a nanotecnologia, pode-se agora projetar verdadeiros nanorobôs, que permitem em princípio controlar a taxa com que o remédio é liberado ao organismo. Uma vez que o nanorobô protege o composto ativo e só o libera em condições pré-determinadas, a administração fica muito simplificada.

Podemos sonhar com uma considerável melhoria em nossa qualidade de vida, inclusive com tratamentos preventivos. A nanotecnologia certamente promoverá enormes avanços nos medicamentos. Mas infelizmente isso não se dá de maneira igual para todo tipo de doença. Para as doenças tropicais, irrelevantes nos países desenvolvidos, os medicamentos ainda são muito menos sofisticados. Aqui, o racionalismo frio da tecnologia e do retorno financeiro não basta! Mas isto é assunto para outra coluna.

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