sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Internet para as máquinas


Ninguém duvida que a Internet tenha sido uma das criações mais importantes de toda a história, com um impacto imenso em nossas vidas. Poucas inovações alteraram de maneira tão marcante a forma de viver dos humanos, por afetar todo tipo de atividade.

Apesar de reconhecer a maravilha e a utilidade da Internet, constatei com surpresa uma limitação sua crucial: a Internet foi feita só para os humanos, e não pode ser usada pelas máquinas (não facilmente pelo menos!). Percebi essa limitação após o físico Tim Berners-Lee criar o conceito de Web Semântica, que explicarei a seguir. Ele, que foi um dos pioneiros da Internet, deve também ter verificado que poderia ter sido mais ousado, e já de início conceber um sistema passível de uso por computadores ou máquinas.

Notem que, a despeito de robôs virtuais poderem fazer busca e agir na Internet, quase sempre é necessária a intervenção humana. Para a maioria esmagadora dos usos que fazemos da Internet, precisamos nós mesmos buscar a informação e processá-la.

Para que pessoas possam ter acesso a páginas na Internet em diferentes línguas e dispositivos de acesso, como computadores diferentes e outros meios, é necessário padronizar. O conteúdo exposto pelo responsável por uma página na Internet é codificado de tal maneira que textos e imagens apareçam com as cores e localizações pretendidas. Apesar dessa padronização, a interpretação do conteúdo só pode ser feita por humanos, pois não há marcas que permitam a uma máquina inferir o que está escrito ou mostrado.

Na concepção da Web Semântica, Tim Berners-Lee – que para mim se redimiu de ter criado uma Internet limitada a humanos – propõe que todo o conteúdo de uma página tenha marcas semânticas, tornando-o passível de interpretação automática por uma máquina.

Para exemplificar os benefícios da implementação de um sistema como o da Web Semântica, discutirei uma aplicação bastante simples. Suponhamos que um grupo de 10 casais fosse a um casamento em outra cidade. Eles poderiam contratar um agente de viagens que teria a seguinte missão:
i) Reservar os 10 quartos de hotel, preferivelmente no mesmo hotel para todos, e que seja próximo do local do casamento.
ii)    Organizar transporte do aeroporto até o hotel ou hotéis.
iii) Marcar horários em salões de beleza para as 10 esposas. Como são muitas, provavelmente seria necessário utilizar mais de um salão.
iv)  Organizar transporte para as esposas até os salões de beleza e de volta para o hotel. Aqui é essencial garantir que todas voltem a tempo para o casamento, o que também requer que a localização dos salões seja conveniente.
v) Como os maridos terão tempo livre, querem assistir a um jogo de futebol na televisão, em um canal pago de esportes que provavelmente não está disponível no hotel (ou hotéis). O agente deve verificar a disponibilidade, e se não houver, reservar mesa num bar de esportes em que o jogo será mostrado. Também é necessário organizar transporte e escolher um bar em local conveniente.

Provavelmente o agente usará a Internet para todas essas tarefas. Devido à necessidade de sincronização e verificação da duração de alguns eventos, é quase certo que alguns agendamentos serão feitos por telefone. Apesar de serem tarefas muito simples, hoje apenas um agente humano consegue realizá-las.

Com a Web Semântica, a expectativa é que um agente “virtual”, de software, pudesse cuidar de todas as tarefas mencionadas. Não é difícil imaginar que as informações nas páginas de hotéis, salões de beleza e agências de táxi teriam que ser mais completas do que são hoje. E o mais importante, que as informações pudessem ser processadas por uma máquina, o agente virtual em nosso caso.

Embora continue achando a ideia genial, não acredito que a Web Semântica possa ser implementada como inicialmente proposta. A grande dificuldade está na necessidade de que todo o material colocado na Internet seja recodificado. Na época da proposição da Web Semântica, em 2001, a Internet era relativamente recente e talvez fosse viável iniciar novas páginas já com a codificação semântica. Isso seria impossível hoje.

De qualquer forma, talvez o leitor tenha percebido que – mesmo sem Web Semântica – estamos nos aproximando de agentes virtuais como o mencionado acima. Basta lembrar dos aplicativos que surgem a cada dia, principalmente para os telefones celulares. São inúmeras as tarefas que podem ser executadas para facilitar nossas vidas, incluindo a escolha de melhores rotas para evitar congestionamentos e informação sobre restaurantes nas imediações.


Seja com um conceito como a Web Semântica ou com aplicativos cada vez mais sofisticados, os agentes virtuais só serão úteis se puderem se comunicar conosco em língua natural. Pois queremos passar instruções como escrevi na especificação da tarefa relacionada ao casamento acima, por texto ou fala. Se a comunicação com o agente virtual exigir conhecimento de sistemas computacionais e muitas interações com o usuário, será mais fácil executarmos as tarefas nós próprios. Como fazemos hoje com a nossa limitada Internet.  

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